Introdução
O
grande objetivo das discussões aqui trazidas é tentar de alguma maneira
traduzir o significado das praticas médicas na idade média. Segundo o médico
historiador Paulo Gabriel Hilu, a história das grandes epidemias durante o período
medieval é capaz de ser utilizada como
objeto de estudo da própria sociedade. Segundo ele, “a doença é quase sempre um
elemento de desorganização e reorganização social; a esse respeito ela torna
mais visíveis as articulações essências do grupo, as linhas de força e as
tensões que os transpassam.” Nós aqui, pretendemos usar características sócio-espaciais
dessa sociedade para elucidar a disseminação dessas doenças e assim os seus
respectivos tratamentos.
O
primeiro ponto é definir epidemias como um grupo grande doenças que possuem
cada uma sua particularidade, mas que quando postas juntas na sociedade
medieval trazem consequências similares como o aumento da mortalidade. No entanto,
a peste negra e lepra são doenças muito diferentes. Trataremos especificamente
da lepra. Enquanto a peste negra era uma doença
que matava muito rápido, a lepra trazia sintomas por um longo período de
tempo, o que levava a maiores medidas preventivas. A principal era a exclusão
dos leprosos, que eram expulsos das cidades em ascensão e levados a centros próprios
onde viviam à margem da sociedade em péssimas condições. A lepra não surgiu na
idade média, mas era rara em períodos anteriores à ela. Assim, a grande disseminação da doença contribuiu
para o seu entendimento posterior.
Atualmente
se sabe que a lepra é uma doença contagiosa crônica originada pelo Mycobacterium
leprae. Seus sintomas consistem em enormes variedades de lesões cutâneas e
nos nervos periféricos; o sintoma
inicial consiste em uma mancha na pele sem sensibilidade tátil. A lepra chega a
Europa a partir de tropas romanas vindas do Egito, antes de Cristo. No entanto,
só passa a ser considerada endêmica na Alta Idade Média, segundo registros
históricos e arqueológicos.
Medicina
medieval ligada ao tratamento da lepra
A prática médica
na idade média era muito restringida pela igreja que na alta idade média
recuava o seu avanço ao proibir atividades como a dissecção de cadáveres.
Grande parte do que já se conhecia sobre a medicina era advindo de tratados
hipocráticos que se perderam na cultua cristã nesse período, ou por falta de
tradução ou por domínio na igreja. Com a conquista de Sicilia e de partes da
Espanha mulçumana, o ocidente pode entrar em contato co a medicina oriental, o
que possibilitou o seu avanço. Posteriores traduções de obras completas de Hipócrates
e Galeno fizeram que houvesse uma transformação intelectual da classe médica
ainda na idade média, o que levou a criação de escolas médicas. A primeira
delas foi a Escola Médica de Salerno, na Itália, principal responsável por
introduzir a medicina árabe, baseada nas obras gregas e no empirismo, na
ocidental. Atividades práticas eram desenvolvidas nessas escolas com o objetivo
de entender (diagnosticar) e agir (tratar) sobre diversas doenças.
Por mais que houvesse desenvolvimento médico empírico na época,
a lepra, já mais compreendida, não possuía cura. Muitos acreditavam que a lepra
era resultado de uma relação sexual em períodos de abstinência sexual impostos
pela igreja, como no período menstrual da mulher, considerado impuro. Já havia
registro desse tipo de diagnóstico na época, O Lírio da Medicina, escrito em 1305 descreve:
“O homem
leproso é (...) porque é engendrado durante as menstruações ou porque é filho
de leproso, ou porque um leproso conheceu uma mulher grávida, e então a criança
será leprosa, a lepra advém destas graves deficiências de geração.”
Vale
lembrar que apesar do desenvolvimento de escolas médicas, as doenças ainda eram
vistas como castigo divino uma vez que o corpo era um retrato da alma. Desse
modo, a determinação da lepra ainda era função da igreja e as medidas de
cotrole da doença com a segregação dos leprosos eram consideradas medidas
médicas da época.